‘Para mim não existe nenhum alimento proibido’, diz cozinheiro que perdeu 63 quilos

“Emagrecer foi a busca inteira da minha vida. Tento desde os 9 anos de idade, quando minha mãe me colocou num programa de mestrado de uma nutricionista da Universidade de São Paulo (USP), ali comecei a fazer dietas e exercícios. Foi uma coisa intermitente, eu engordava e emagrecia, estava sempre em dieta ou em períodos de férias da dieta. Vivi num 8 ou 80 a vida inteira. O resultado desses períodos “on e off” sempre eram alguns quilos a mais. Perdia dez, mas ganhava 14. Depois, perdia os 14 e ganhava 17.

As coisas mudaram em dezembro de 2022, quando comecei uma mudança de estilo de vida que me fez perder 63 quilos até agora. Nesse período, tomei medicamento — o Ozempic — mas em uma dose muito baixa, com prescrição e acompanhamento médico constante. Eu cheguei a tomar o mesmo remédio em outra ocasião, mas até engordei, porque estava em outro momento da cabeça, não estava querendo emagrecer de verdade. Neste momento tomo uma dose correspondente ao início do tratamento para uma mulher e continuo emagrecendo. Quero perder ainda outros 22 quilos e sigo no plano.

Minha família por parte de pai tem histórico de sobrepeso. Ao longo da vida, descobri que não adianta tentar compensar uma dieta muito calórica com esporte. Você faz duas horas de corrida e “estraga” tudo isso tomando um sorvete a mais. Fiz todo o tipo de atividade física que você possa imaginar: karatê, capoeira, judô, kickboxing, muay thai, jiu jitsu, futebol, natação, tênis, basquete, eu já fiz de tudo desde a infância.

Nunca fui diagnosticado com compulsão alimentar, mas acho que isso acontecia. Claro, tinha episódios de comer muito, houve meses em que pedi delivery de comida todos os dias. Assim que eu saí do reality show culinário que participei, o MasterChef, eu fazia comida de restaurante diariamente em minha casa, alguns pratos tinham toneladas de manteiga. Mas o que me pegava mesmo eram os períodos sedentário, em que não saia de casa para nada. Qualquer coisa que eu comesse ia me engordar, é claro.

Houve um momento, no ápice do meu peso, no ano retrasado, aos 175 quilos, que eu pedia McDonald’s com minha namorada (que pesa 45 quilos), e para mim eu escolhia um combo, com batata grande, nuggets e as vezes mais um sanduíche. Nesse tanto, eu já teria comido as calorias totais recomendadas para um adulto ao longo de um dia em apenas em uma refeição. Foi no meio da pandemia que cheguei ao meu maior peso, sentia cansaço só de me secar após o banho. Quando eu cheguei a esse patamar, passei a viver coisas que não sabia como era. Comecei a comprar roupa em lojas plus size, precisei de uma balança específica que aguentasse meu peso. Ali comecei a me perguntar o que estava acontecendo.

Essa mudança que estou vivendo ocorreu após uma amiga médica me indicar fortemente que eu visitasse um novo médico endocrinologista. Ele flexibilizou minha cabeça e mudou minha vida. No começo ele me perguntou o que eu achava da cirurgia bariátrica, disse que não queria. Ao fazer os exames, notamos que eu estava pré-diabético. Até então, eu nunca tinha passado por qualquer problema de saúde relacionado à obesidade. Era a minha desculpa para manter-me da mesma maneira. Quando veio esse indicativo, me preocupei. Eu tenho um avô que chegou a perder a visão por conta da diabetes. Fiquei com muito medo. Tive apneia do sono e até hoje durmo com CPAP (um tipo de ventilador nasal que ajuda a evitar o ronco e a obstrução das vias aéreas) e essas coisas me fizeram pensar como eu iria envelhecer. Pensei se iria chegar na velhice. Como eu chegaria a essa fase da vida? Bem? Numa cadeira de rodas? Tomando muitos remédios?

Cheguei a ir à fisiculturistas para tentar perder peso. Antes minha motivação para emagrecer era ligada à aparência, hoje não penso isso. Tenho uma razão muito mais nobre: quero envelhecer com qualidade de vida. Sempre comi comida de mãe, arroz, feijão, carne e muitas frutas. Notei, com a ajuda do médico, que dava para fazer reduções que aos poucos me levariam os 85 quilos que eu queria perder. Antes eu usava altos volumes de azeite pra cozinhar, agora um litro dura meses aqui em casa. Troquei o contra filé por frango e outras pequenas alterações. E cortei o álcool. Só com álcool fora da minha rotina, dá pra economizar boas calorias.”

O básico que funciona

“O que fez dar certo pra mim foi o básico: contar calorias. Isso de comer castanhas três da tarde, ter cardápio, não funciona para mim. Tenho linhas gerais que eu sigo para minha nutrição. Além de contar as calorias, aposto em uma grande variedade de alimentos, para ter os nutrientes que eu preciso. Nesse esqueleto, eu encaixo o que eu quero. Se eu quiser um sorvete de 200 calorias, eu vou lá e compro. Coloco no aplicativo do celular que uso para controlar isso e depois dou uma ajustada no arroz do jantar. Faço os arranjos necessários para não passar da média.

Em outras ocasiões, eu chegava a fazer “despedidas” da comida. Aproveitava muito, porque achava que “ia virar atleta”. Uma das mudanças que eu tive foi entender que se me der muita vontade de uma comida posso comer, amanhã, quem sabe. Não preciso comer agora para “me despedir”. Para mim não existe nada, nenhum alimento, proibido.

Na internet, onde conto minha rotina, muita gente manda mensagem de agradecimento, e também os parabéns pela mudança de vida. Há quem ainda repita um estereótipo negativo, falando coisas punitivas, que não consegue emagrecer, igual a mim, porque “não tem vergonha na cara”. Não é nada disso. Acho que a gente tem que pegar leve com nós mesmos. Eu sou um cara que gosta de comer e não vou parar. Acho que o ponto inicial é se respeitar em primeiro lugar.

E digo que continua sendo gostoso comer. Ter o ritual de conhecer a comida, olhar as calorias, ajuda a me controlar a não pegar dez chocolatinhos de uma vez. Hoje vejo que essa atitude faz eu me sentir culpado e ainda vai me levar à fome depois — afinal, eu quero compensar as calorias. E tem o exercício físico, chego a andar três horas de bike por dia, sei que isso será algo difícil de manter no futuro. Mas a musculação e a dieta serão para a vida inteira, até porque já atingi um peso máximo e sempre preciso observar para não ir, aos poucos, voltando a esse patamar.

Penso que esse meu esforço no exercício físico vai acabar culminando em um campeonato de powerlifting (levantamento de peso), numa maratona ou em um triatlo. Mas tenho zero pressa. Não quero chutar a balança para outro extremo. Eu busco o equilíbrio.

Hoje sinto mais prazer na comida. Eu me planejo para comer algo gostoso. Por exemplo, um purê de batatas francês, o original mesmo, que leva na receita a mesma quantidade de batatas, manteiga e creme de leite: ele é uma bomba calórica. Antes para mim, era um prato banal, fazia na minha casa em uma terça qualquer. Agora não. Se vou cozinhar algo assim à noite, ou sair para jantar com a minha namorada, eu faço um almoço mais tranquilo — não vou comer um parmegiana antes. Isso faz o prato ser mais saboroso, mais valorizado.

Sabe uma coisa que me preocupava? As cadeiras dos restaurantes, tinha medo de ficar preso nelas. Se íamos combinar um aniversário de amigos, eu pesquisava o lugar na internet para ver como eram os assentos, com ou sem braços. Se um dia eu for montar um restaurante, é fato que as cadeiras não terão braços. Vou te dizer, minha vida é melhor com menos peso. Mas essa é uma conversa que cada um tem que ter com seu médico. Não cabe a um professor, por exemplo, colocar abobrinha na cabeça de um aluno falando que ele não vai conseguir emprego se não emagrecer. Familiar não tem que atormentar, não encham o saco dessas pessoas. Deixa que a pessoa — quando quiser emagrecer — vai.”

*Em depoimento à jornalista Mariana Rosário

Fonte: o globo

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