Prefeito de 65 anos se casa com adolescente de 16 anos: o que diz a lei?

O caso do prefeito de Araucária, no Paraná, Hissam Hussein Dehaini, de 65 anos, que casou com uma adolescente de 16 anos, revolta internautas. A mãe da jovem tinha um cargo comissionado na prefeitura da cidade e foi promovida à secretária de Cultura. A tia da menina também é comissionada na prefeitura. Segundo documento, a união foi possível com o consentimento dos pais, conforme consta em registro oficial do cartório de 12 de abril.

Pensando nisso, a Itatiaia conversou com Carla Silene, advogada criminalista e professora no Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) para esclarecer o que diz a lei do casamento com adolescentes, se houve crime no caso do prefeito e as causas dos casamentos infantis no Brasil.

Em um primeiro momento, a advogada afirma ser necessário que a polícia investigue em que circunstância o casamento ocorreu, ou seja, se os trâmites legais foram observados. “É preciso averiguar se havia uma relação entre Hissam e a esposa, anteriormente, ao casamento, se ela era consentida pela adolescente, se houve algum tipo de violência”, analisou.

Já a questão da nomeação da sogra como secretária, a polícia deve verifica as circunstâncias em que a promoção se deu. “Antes destas investigações é prematuro falar na ocorrência de algum crime”, acrescentou. Ontem, o Ministério Público do Paraná afirmou que está investigando o caso.

O que diz a lei do casamento com adolescentes?

Em 2019, foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro a Lei 13.811, que proíbe o casamento de menores de 16 anos. Originada de projeto de autoria da ex-deputada Laura Carneiro, a matéria foi aprovada pelo Senado em fevereiro. O Código Civil prevê a possibilidade na qual pais ou responsáveis de jovens com 16 e 17 anos podem autorizar a união.

“Caso não haja a autorização dos pais, é possível o suprimento judicial do consentimento, que nada mais é do que um processo judicial onde o maior de 16 e menor de 18 anos, via um advogado, pede ao juiz que analise a questão e, se achar razoável, supra a autorização dos pais por meio de uma sentença”, explicou a especialista.

O novo texto estabelece que “não será permitido, em qualquer caso, o casamento de quem não atingiu a idade núbil”. A legislação anterior admitia o casamento em caso de gravidez ou para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal, já que ter relações sexuais com menores de 14 anos é crime com pena que vai de 8 a 15 anos de reclusão.

Brasil lidera casamentos infantis

Conforme a Organização das Nações Unidas (ONU), o casamento infantil é a união formal ou informal em que pelo menos uma das partes tenha menos de 18 anos. O Brasil ocupa o quinto lugar no mundo em casamentos infantis, segundo pesquisa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), ficando atrás apenas para Índia, Bangladesh, Nigéria e Etiópia. 

“A questão é que muitas das uniões que ocorrem com pessoas menores de 16 anos e maiores de 70 não são formalizadas, o que não significa que não existam; e considerando que a maioria delas ocorre exatamente na camada invisível da população, sequer alcançam o sistema de Justiça. A lei só atinge os casos em que há uma união formal”.

Ela aponta que questão é mais complexa quando sabemos que existem muitas pessoas que estão abaixo de 16 anos e acima de 70 anos vivendo como se fossem casadas.

“Em relação às crianças e aos adolescentes, as principais motivações para as uniões forçadas, segundo o estudo sobre o casamento infantil no Brasil ”Tirando o Véu” são: gravidez não planejada; amor e desejo de constituir família; vivência da sexualidade; necessidade de sair de lares conflituosos; desejo pela maternidade; proteção contra violência e sanção da comunidade; isto é, muitas vezes a falta de oportunidades pauta a união”, pontuou. O resultado é que muitas dessas uniões configuram estupro de vulnerável.

Para combatermos os abusos nas uniões forçadas entre crianças, a especialista aponta que a primeira questão é “retirar o véu, é enxergar a realidade.” “A partir dela, com a participação popular, é possível pensar em políticas públicas na área da saúde, da educação e da cidadania que colaborem para que uniões forçadas não aconteçam”, finalizou.

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